Folgas, churrasco, cesta básica, um pernil para cada empregado, boi no rolete, sorteio de dinheiro e até 14º salário são algumas das ofertas de patrões mineiros a seus empregados, caso o presidente Jair Bolsonaro (PL) seja reeleito no próximo domingo (30), revelou a Repórter Brasil nesta semana. Em caso de derrota, porém, a perspectiva é de punição, com demissão, corte de vagas, transferências de cidade ou até o fechamento da empresa.
Segundo maior colégio eleitoral do país, com 16 milhões de eleitores, Minas é apontado como estado-chave para a eleição presidencial, sendo um dos principais palcos do embate entre Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta reta final de campanha.
No mês de outubro, a pressão eleitoral recaiu sobre os trabalhadores. O Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais abriu 350 investigações no segundo turno por assédio eleitoral de empregadores, que vão de promessas de benesses a ameaças de demissão. A prática é proibida por lei e pode levar à prisão.
“Como Minas pode decidir a eleição, a disputa acaba resvalando para as relações de trabalho, num esquema de voto de cabresto moderno”, afirma a procuradora do trabalho Ana Cláudia Nascimento Gomes.
As ameaças e ofertas aos trabalhadores podem ser configuradas prática de assédio eleitoral e abuso do poder econômico do empregador.
São crimes previstos nos artigos 299 e 301 do Código Eleitoral, com pena de até quatro anos de prisão e pagamento de multa, como ocorreu um fabricante de iates de luxo. No caso de servidores públicos coagidos, a pena é de detenção de até seis meses, mais multa.
Enquanto a pressão aumenta sobre os trabalhadores, a fiscalização trabalhista sofre com a falta de dinheiro para atuar em Minas Gerais, já que 55% dos recursos foram cortados no governo Bolsonaro. Auditores fiscais do trabalho disseram à Repórter Brasil que não há verba para gasolina e outras despesas. Com isso, as equipes não podem investigar denúncias em MG, incluindo de suspeitas de trabalho escravo.
O trabalho da fiscalização é fundamental para mostrar como grandes empresas se beneficiam da exploração da mão de obra. Também em outubro, a Repórter Brasil mostrou que fazendas de café gourmet e certificado em MG foram flagradas com trabalho escravo.
Uma operação resgatou 27 vítimas nas Fazendas Olhos D’Água e Klem, nas cidades mineiras de Campos Altos e Manhumirim, respectivamente. O caso chamou a atenção pois duas propriedades contam com a certificação da Rainforest Alliance, principal organização internacional que fiscaliza cadeias produtivas de alimentos, O selo deveria garantir que e atesta que o café é cultivado sob boas práticas socioambientais.
Em um dos flagrantes, na Fazenda Klem, a fiscalização trabalhista encontrou parte do grupo resgatado colhendo café de meias e descalços. Aliciados na Bahia, os safristas atuavam na informalidade, sem registro em carteira ou garantia de direitos trabalhistas.
Em outubro, o Ministério do Trabalho atualizou a "lista suja" do trabalho escravo com 95 novos empregadores responsabilizados por submeter 685 trabalhadores às formas contemporâneas de escravidão. Alguns dos casos revelam perversidade.
Em um deles, os trabalhadores ficavam trancafiados em um porão sem janelas nem entradas de ar, dormiam amontoados e trabalhavam diuturnamente na produção de cigarros falsificados. Parecia um filme de terror, mas era a vida real de 17 trabalhadores paraguaios e um brasileiro em Triunfo (RS), a 80 km de Porto Alegre, descoberta durante operação em outubro de 2021.
Também em outubro, a "lista suja" sofreu um duro golpe. Flagrada sete vezes com trabalhadores em situação análoga à escravidão em suas obras, a última delas no ano passado, a construtora MRV assinou acordo com o governo que a deixa de fora da “lista suja” do trabalho escravo. Com isso, a empresa garante acesso a crédito e evita constrangimentos que poderiam dificultar novos negócios.
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